sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Jambo com sal

_A senhora nunca comeu jambo com sal?
Essa frase, dita por uma aluna dia desses no intervalo da aula foi o suficiente para me fazer refletir sobre a vida nas grandes cidades...  Jambo com sal! Manga com sal, um outro aluno também me questionou se nunca havia provado. Confesso que nem sei como é jambo. A linda aluna, ainda, seguiu-se com essa:
_Ah, a senhora não conhece as coisas boas da vida!
Viver na selva urbana em que se transformou a cidade do Rio nos tirou o olhar às coisas simples da vida. O bom é aquilo que é “glamurizado” por ser industrial. O máximo é abrir sua geladeira e ver caixas de lasanha e pizza congeladas, caixas de nuggets, muitas coisas industrializadas, que são práticas no dia a dia corrido de quem fica horas no trânsito, trabalha longe de casa, estuda, tem que chegar em casa e ainda preparar alguma coisa para comer. A lasanha salva o dia. E destrói, a longo prazo, seu estômago, faz a sua pressão subir e todos aqueles problemas que você aprendeu no programa matinal da televisão, mas não liga. Para muitos, é uma grande ostentação ter caixas de qualquer coisa industrializada na geladeira. É um orgulho encher o carrinho do mercado com produtos que não faziam parte da realidade de um grande número de pessoas há alguns anos. Percebi que os carrinhos de compra estão cada vez mais cheios. Caixas, caixas, quilos de sódio. Vale lembrar que ostentar está na moda...
Outro dia, conversando sobre a culinária local, com a qual eu ainda não havia tido contato, um aluno disse que me traria a tapioca que ele costuma fazer em casa. E disse ser muito melhor do que a vendida pelos ambulantes. Sem “glamour”, mas com um carinho especial. “O essencial é invisível aos olhos”, já disse Saint –Exupéry, no seu famoso clássico. Para mim, já é a melhor tapioca do mundo, feita não apenas para ser consumida, mas para que eu conheça melhor aquele menino que sempre veste camisa de banda de Rock.
O simples é mais, num momento em que o “status” de uma pessoa é medido pela quantidade de industrializados que consome. Nas escolas, quantas histórias ouvi de crianças que sofriam gozações dos colegas por terem levado nas suas merendeiras frutas. O menino que era “zoado” na escola porque tinha em sua lancheira fruta de conde. Ora, quem come fruta de conde?? O menino, ué. Ele não pode? Ah, ele nunca compra lanche, deve ser pobre. Ser é ter, mentalidade que vem se desenvolvendo precocemente nas escolas...
 Uma vez, no colégio em que trabalhava, fiquei uns minutos observando a cantina. Quase todas as crianças compravam seus lanches, e só consumiam salgadinhos assados, os quais chamo de isopor temperado, com refrigerante. As alunas mais gordinhas pediam refrigerante light. Meninas com seus 8, 10 anos. O problema: isso acontecia (e acontece na maioria das escolas) todos os dias. Uma vez, reclamei na escola dos meus filhos, que a cantina só vendia refrigerante e salgados. A coordenadora me disse que, se não vendesse os tais salgados, os alunos reclamariam, já que são acostumados a isso. As próprias mães reclamariam. Numa feira de Ciências da escola, cujo tema era vida saudável, os alunos apresentaram trabalhos, cartazes sobre o tema. Degustação de produtos saudáveis, festival de barrinhas de cereais, enfim. Percebi um  movimento grande na cantina. E não é que eram os pais e crianças comprando pizza, salgados e refrigerantes, após todo aquele trabalho sobre alimentação saudável? E como vendeu!!
Crianças doentes, com pressão alta, diabetes, colesterol alto. Pais trabalhando ainda mais para pagar a escola, o plano de saúde, os remédios, a natação, o futebol, as caixas de lasanha, os nuggets, o lanche  diário na cantina.

Enquanto isso, acho que preciso provar logo jambo com sal e a tapioca do menino roqueiro. Preciso conhecer as coisas boas da vida. Simples.

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