_A senhora nunca comeu jambo
com sal?
Essa frase, dita por uma aluna
dia desses no intervalo da aula foi o suficiente para me fazer refletir sobre a
vida nas grandes cidades... Jambo com
sal! Manga com sal, um outro aluno também me questionou se nunca havia provado.
Confesso que nem sei como é jambo. A linda aluna, ainda, seguiu-se com essa:
_Ah, a senhora não conhece as
coisas boas da vida!
Viver na selva urbana em que se
transformou a cidade do Rio nos tirou o olhar às coisas simples da vida. O bom
é aquilo que é “glamurizado” por ser industrial. O máximo é abrir sua geladeira
e ver caixas de lasanha e pizza congeladas, caixas de nuggets, muitas coisas
industrializadas, que são práticas no dia a dia corrido de quem fica horas no
trânsito, trabalha longe de casa, estuda, tem que chegar em casa e ainda
preparar alguma coisa para comer. A lasanha salva o dia. E destrói, a longo
prazo, seu estômago, faz a sua pressão subir e todos aqueles problemas que você
aprendeu no programa matinal da televisão, mas não liga. Para muitos, é uma
grande ostentação ter caixas de qualquer coisa industrializada na geladeira. É
um orgulho encher o carrinho do mercado com produtos que não faziam parte da
realidade de um grande número de pessoas há alguns anos. Percebi que os carrinhos
de compra estão cada vez mais cheios. Caixas, caixas, quilos de sódio. Vale
lembrar que ostentar está na moda...
Outro dia, conversando sobre a
culinária local, com a qual eu ainda não havia tido contato, um aluno disse que
me traria a tapioca que ele costuma fazer em casa. E disse ser muito melhor do
que a vendida pelos ambulantes. Sem “glamour”, mas com um carinho especial. “O
essencial é invisível aos olhos”, já disse Saint –Exupéry, no seu famoso
clássico. Para mim, já é a melhor tapioca do mundo, feita não apenas para ser
consumida, mas para que eu conheça melhor aquele menino que sempre veste camisa
de banda de Rock.
O simples é mais, num momento
em que o “status” de uma pessoa é medido pela quantidade de industrializados
que consome. Nas escolas, quantas histórias ouvi de crianças que sofriam
gozações dos colegas por terem levado nas suas merendeiras frutas. O menino que
era “zoado” na escola porque tinha em sua lancheira fruta de conde. Ora, quem
come fruta de conde?? O menino, ué. Ele não pode? Ah, ele nunca compra lanche,
deve ser pobre. Ser é ter, mentalidade que vem se desenvolvendo precocemente
nas escolas...
Uma vez, no colégio em que trabalhava, fiquei
uns minutos observando a cantina. Quase todas as crianças compravam seus
lanches, e só consumiam salgadinhos assados, os quais chamo de isopor
temperado, com refrigerante. As alunas mais gordinhas pediam refrigerante
light. Meninas com seus 8, 10 anos. O problema: isso acontecia (e acontece na
maioria das escolas) todos os dias. Uma vez, reclamei na escola dos meus
filhos, que a cantina só vendia refrigerante e salgados. A coordenadora me
disse que, se não vendesse os tais salgados, os alunos reclamariam, já que são
acostumados a isso. As próprias mães reclamariam. Numa feira de Ciências da
escola, cujo tema era vida saudável, os alunos apresentaram trabalhos, cartazes
sobre o tema. Degustação de produtos saudáveis, festival de barrinhas de
cereais, enfim. Percebi um movimento
grande na cantina. E não é que eram os pais e crianças comprando pizza,
salgados e refrigerantes, após todo aquele trabalho sobre alimentação saudável?
E como vendeu!!
Crianças doentes, com pressão
alta, diabetes, colesterol alto. Pais trabalhando ainda mais para pagar a
escola, o plano de saúde, os remédios, a natação, o futebol, as caixas de
lasanha, os nuggets, o lanche diário na
cantina.
Enquanto isso, acho que preciso
provar logo jambo com sal e a tapioca do menino roqueiro. Preciso conhecer as
coisas boas da vida. Simples.
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